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sábado, outubro 27, 2018

Resitência


Minha primeira lembrança política é de 1984, com as Diretas Já. Eu era muito pequena, mas lembro da comoção do meu pai com o assunto. Acompanhamos juntos a eleição indireta para presidente, e perguntei para ele "quem é melhor, o Tancredo ou o Maluf", e ele respondeu "O Tancredo é o menor pior". Meu pai largou o Exército meses antes do Golpe de 64. Eu mal sabia ler e ele já me explicara o que era a ditadura. Nasci durante o regime militar, e minha infância foi na transição para a democracia. Lembro da minha mãe em filas gigantes para comprar um quilo de carne; lembro dos milhares de planos cruzados e cortes de zero na moeda. E lembro do meu pai chorando ao votar pela primeira vez, em 1986, para Governador. Ele morreu antes de votar para presidente, em 1989.

Por outro lado, minha avó (mãe da minha mãe) era getulista e brizolista. Votou até o fim da vida e, quando eu era adolescente, volta e meia discordava de suas opiniões políticas.

Mas o ápice da minha vida política foi aos 12 anos de idade. Falei para o meu pai que eu era socialista e que Mikhail Gorbatchev era o cara. Eu queria mudar o mundo. Eu achava que podia fazer a diferença.

Cresci em uma família de homens e mulheres machistas. O racismo também faz parte da minha vida desde sempre. Quando dizia que era negra (na minha certidão de nascimento está escrito que sou branca), a família ficava incrédula. Quando defendia que mulheres têm os mesmos direitos que os homens, ninguém me apoiava.

Sou filha única, então escolhi entre os meus amigos e amigas aqueles que seriam meus irmãos e irmãs. Respeito a opinião de todos, e acho fácil gostar de quem pensa como eu: difícil é gostar de quem é diferente de mim. Porém, há algumas escolhas que me deixam tristes, especialmente vindo de pessoas que defendiam causas que julgo importantes.

Tenho muitos defeitos, inclusive volta e meia me pego falando algo que pode soar preconceituoso. Justo eu, que sempre fui defensora das minorias, ainda que não sejamos mais minorias, né? O mundo mudou, e eu tento de verdade julgar menos o outro (embora seja julgada 24 horas por dia nas redes sociais). E neste momento em que o mundo está num julgamento agressivo, refleti qual deveriam ser as minhas palavras sobre o tema.

Segunda-feira talvez não seja um lindo dia para muitos, mas o que importa é que algumas pessoas que eu quero bem não me pediram explicações, não quiseram saber o meu voto , não me marcaram em suas publicações nem julgaram minhas atitudes: elas sabem perfeitamente quem eu sou, e isso não tem preço.

Na dúvida, vai aqui o reforço: continuo contra qualquer preconceito; continuo sendo feminista; continuo gostando de futebol que, dizem, é coisa de homem. Continuo fazendo a limpa no Facebook não por questões políticas, mas por questões de falta de 'simancol' mesmo. Continuo sendo a pessoa que defende a cultura como algo tão importante para o mundo como qualquer outro assunto. Continuo sendo a pessoa diferente da família, e que até a família teve que aprender a aceitar.

E serei sempre resistência, porque resistir é para os fortes. E força é algo que nunca me faltou.

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