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domingo, julho 02, 2017

90 anos


Minha avó foi a pessoa mais autêntica que eu conheci. Aos 18 anos saiu (sozinha) de Itajubá, sul de Minas, para morar no Rio de Janeiro. No Rio, aos 20 anos, casou com um homem 23 anos mais velho, viúvo e pai de seis filhos. Um escândalo! Ficou viúva aos 28. Aos 42 namorava um cara de 27. Outro escândalo! Usava roupas coloridas, pintava as unhas de vermelho, nunca quis casar de novo, morava sozinha. Viajava sozinha também. Adorava comer em restaurantes - ela detestava cozinhar, mas lembro até hoje do seu macarrão com frango e do pastel de camarão que só ela sabia fazer. Escrevia muito bem, pintava quadros, fazia tricô, crochê e bordado.

Na minha infância era ela quem contava histórias para eu dormir. E desenhava, enquanto contava as histórias. Ela me deu meu primeiro livro - Histórias de Dona Benta, do Monteiro Lobato. Leitora voraz, me emprestou, aos 12 anos, A Rosa do Povo, do Drummond, de quem ela era muito fã. Deixou para mim toda a sua coleção de clássicos da literatura, incluindo Os Miseráveis e O Morro dos Ventos Uivantes, os seus livros preferidos.

Adorava Carnaval, frevo, forró e samba. Desfilou na Ala das Baianas da Imperatriz Leopoldinense. Era flamenguista (todo mundo tem defeitos!) e bebia pra caramba. Quem me conhece bem sabe o quanto ela era importante para mim. Ainda é. Sempre será.

Vovó Lenira era loira de olhos verdes. Os mais lindos olhos que já vi. Para os outros era meio rebelde, desaforada, teimosa. Ela era, mas para mim também era autêntica. Uma pessoa única.

Se fosse viva faria 90 anos no dia 2 de julho. Canceriana que trazia a família em rédea curta. Morreu antes de saber das minhas pequenas conquistas pessoais e profissionais. Morreu porque, como ela mesma dizia, preferia morrer a depender dos outros. Morreu porque chegou a sua hora. Mas deixou essa saudade imensa, que sinto sempre que vejo alguma coisa que me lembra ela. E são muitas coisas. Se eu pudesse dizer alguma coisa para ela hoje, diria apenas obrigada. Obrigada por ter sido essa influência iluminada na minha vida, e por me fazer acreditar que uma mulher pode tudo, mesmo que o mundo diga o contrário.

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