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sexta-feira, agosto 21, 2015

As moças que são (ou não) para casar


Eu vejo a humanidade caminhar a passos lentos para sua evolução. E vejo os estereótipos cada vez mais fortalecidos. O mundo é machista, heterossexual e branco. E, pior de tudo, julga as pessoas sem dó nem piedade. Uma das coisas que mais sofri - e ainda sofro - em meus 14 anos em São Paulo é o fato de estar aqui sozinha. Isso parece que dá o direito as pessoas a entrarem e saírem da minha vida como elas bem entenderem. Eu sinto, desde que pisei em São Paulo, que sou muito julgada por ser uma carioca solteira aqui. Ai vem os estereótipos, que me irritam demais.

Vamos aos fatos: mulher brasileira tem má fama mundo afora - e a carioca pior ainda. A carioca é considerada fácil, aquela que anda de roupa curta e decote, oferecida, o tipo que o cara chegou e já vai pegar. A carioca é a típica mulher que serve para uma noite e nada mais. Vejo que as moças de São Paulo são sempre mais reservadas, muitas fazem o estilo pudica e de noite se transformam. Acho interessante como as paulistanas conseguem ser exuberantes e elegantes ao sair para baladas e afins,

Já a carioca, né, gente, é aquela coisa rasteirinha e palavrão, um escracho só. Mas tem o sotaque fofo, algo que vira fetiche quando a gente abre a boca e fala um 'é mexxxxmo' que faz o homem dar aquela risadinha safada e rídicula. Tédio desses momentos.

Eu perdi as contas das coisas que já ouvi por causa desse meu jeito 'carioca de ser'. Sim, eu uso vestido. Sim, eu uso saia. Sim, eu não ando sempre de salto alto porque eu não gosto mais de usar salto alto. Sim, eu não uso maquiagem. Sim, eu gosto de cabelo curto. Sim, eu falo palavrão, Sim, eu sou o tipo que ri com os meninos, bebe cerveja com os meninos, fala de futebol com os meninos, mas, putz, eu não sou um menino.

No trabalho eu sempre tive que me impor com atitudes fortes e desconcertantes - sou a rainha das frases de efeito - para poder me respeitarem. Vinda da publicidade, um universo masculino, eu precisava me impor para não ser tratada como um bibelô. Uma vez, ao ser demitida, o diretor de criação da agência me perguntou se eu não ia chorar. Minha resposta: 'Eu não sou o tipo de mulher que você está acostumado a trabalhar. Essa não é minha primeira demissão, e nem vai ser a última. Quando eu recebo?'

Meu jeito estúpido de ser, aquela coisa 'pé no peito' que a vida me ensinou, é fruto de um machismo que está por toda parte - e sai do trabalho e invade os relacionamentos. Vamos aos exemplos:

- Ficante que reclama do tamanho da roupa. Ele: "Se você fosse minha namorada não usava um vestido curto assim." Eu: "Ainda bem que não sou, por isso vou usar sempre."

- Ficante que reclama que você passou só 40 dias na cidade, e que vive viajando. Minha resposta: "Quando você me conheceu eu já viajava, e sinto te dizer, eu vou continuar viajando."

- Namorado que reclama que você vai passar o feriado no Rio. Minha resposta:"Eu te convidei para viajar comigo. Você não quer. Então só por causa disso eu não vou?"

- Namorado que reclama que você é muito auto-suficiente. Minha resposta: "Você prefere alguém que pegue no seu pé?"

Foram várias ao longo dos anos, mas a pior de todas é aquele jeito mequetrefe de terminar relacionamentos, quando a pessoa acha que tem o direito de te humilhar e ofender. Ai eu me pergunto: será que se eu tivesse família aqui, se fosse o estereótipo de 'moça de família', o cara ia ficar insistindo para ir na minha casa; e se eu disser não ele ia ficar ofendido? Por que eu não tenho família aqui eu sou obrigada a abrigar no meu lar pessoas que mal conheço? Por que a mulher que mora sozinha e/ou divide apartamento é obrigada a ser liberal em todos os sentidos? Eu não posso preservar a minha casa e a minha vida de pessoas que eu ainda não sei se vieram para ficar ou estão só de passagem?

Eu não sou perfeita - graças a Deus - mas eu sou isso aí mesmo, essa pessoa fofa e adorável que, se pisar no calo, vai levar patada. Eu não vim ao mundo a passeio, eu não sou trouxa, e não é porque sou independente e dona do meu nariz arrebitado que as pessoas - em relações pessoais, sentimentais ou profissionais - têm o direito de entrar na minha vida, fazer o que querem e sair como se nada tivesse acontecido.

Ser mulher, independente, estar longe de casa e da família, ter um trabalho legal, viajar, ter amigos, enfim, ter vida própria, é algo que não deveria ser negativo, muito menos ser motivo para as pessoas tratarem a gente como se fossemos o nada.

O que eu vejo claramente é o mundo dividido entre 'moças de família', que moram com os pais e mantêm suas vidas numa bolha cor de rosa, onde elas inspiram confiança de que serão progenitoras e perpetuarão a espécie; e moças como eu, que saíram de casa, foram à luta, entregaram-se a esse mundo machista com a cara e a coragem e, graças a isso, estão pagando um preço alto. Tenho a impressão que os homens me veem como essa mulher 'liberal', afinal, ainda nos dias de hoje uma mulher que sai de casa para viver sua vida - e não para casar - é rotulada da pior forma possível.

É por isso que eu digo: eu não pertenço a esse mundo. As pessoas vão dizer que estou enganada, mas eu falo por experiência própria. Pago para ver um homem que realmente entenda que o fato de eu ter saído de casa não quer dizer que eu quero qualquer coisa nessa vida. Muito pelo contrário. Eu sou muito bem educada, tenho meus valores e princípios e posso sim recusar quem não me valoriza. Eu não sou avulsa no mercado como a maioria dos homens pode achar - porque do jeito que me abordam, sinceramente, é como me sinto. Só que eu não sou. O fato da minha família morar longe não significa que sou menos 'moça de família' que qualquer outra. Fica a dica.

Eu quero mais, sempre. E se as pessoas não podem me oferecer isso, não entram na minha casa, nem na minha vida. Simples assim.



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