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segunda-feira, janeiro 29, 2007

Quando o mundo desaba aos seus pés


A Torre de Babel é mencionada no livro de Gênesis como uma torre enorme construída pelos descendentes de Noé, com a finalidade de permitir aos homens alcançar o reino de Deus, no céu. Deus, irado pela audácia humana, teria feito com que todos os trabalhadores da obra começassem a falar idiomas estranhos, de modo que eles não mais podiam se entender nem continuar a construção. É neste evento que, segundo a Bíblia, teriam surgido os diferentes idiomas do mundo.

Babel, em acadiano, é Bab ilu, deriva de Bad ("porta", "portão") e ilu ("Deus") e significa "Porta de Deus". Para os judeus significa "confusão", exatamente como no Gênesis 11:9. Para os cinéfilos, “Babel” é o novo filme do aclamado diretor mexicano Alejandro González Iñarritu, que encerra a trilogia sobre a expiação da culpa iniciada com os excepcionais “Amores Brutos” (Amores Perros, 2000) e “21 gramas” (2003). Se nos dois primeiros filmes tudo girava em torno de um acidente de carro, neste vamos acompanhar quatro histórias, em quatro lugares do mundo, que se desenvolvem por causa de um incidente envolvendo um rifle.

Iñarritu, mais uma vez, impressiona por sua habilidade em narrar várias histórias que se interligam, mas com a nova produção ele resolveu inovar, usando quatro idiomas para contar a trama – e por isso o título do filme é Babel, pois se refere tanto a Torre de Babel quanto a expressão judaica.

O roteiro de Guillermo Arriaga parte da história do casal de americanos Richard (um surpreendentemente envelhecido – mais ainda lindo - Brad Pitt) e Susan (Cate Blanchett), que, em crise no relacionamento, viajam ao Marrocos. No meio do deserto, o ônibus em que eles estão com outros turistas é atingido por uma bala, e Susan fica gravemente ferida. A partir daí, a vida de outras pessoas passa a ser afetada por esse incidente.

De maneira sutil, a história é contada com idas e vindas no tempo. Para quem já vira os outros filmes de Iñarritu, o ritmo de “Babel” é até lento demais. Nos trabalhos anteriores o diretor usou uma edição mais rápida, fazendo com que a história tivesse um ritmo muito veloz. Dessa vez tudo passa devagar, mas se encaixa perfeitamente.

Mas o que decepciona em “Babel” é justamente o roteiro. Arriaga não repete a força das tramas de “Amores Brutos” e “21 gramas” (filmes que eu já comentei neste blog, em “O peso da vida” – 26/01/2004), onde amores trágicos e desejos de vingança resultavam em sentimento de culpa, causando emoção e compaixão no espectador, que não consegue ver estes filmes impunemente – se você não viu os trabalhos anteriores da dupla Iñarritu/Arriaga vai achar “Babel” o máximo, e não vai entender o que estou escrevendo. Mesmo Iñarritu mantendo a maestria da direção e na montagem espetacular do filme, o roteiro não acompanha. A história até apresenta pontos interessantes – o silêncio como forma de incomunicabilidade, o uso de diversos idiomas e a relação de pessoas de várias partes do mundo com o incidente que é o fio condutor da trama – mas falta o que sobrava nos outros filmes: emoção. Mesmo com todos os personagens carregando culpas, seja pela falência de um casamento ou pela morte de um parente, e precisando enfrentar um Deus punitivo, que os abate com uma série de tragédias, nada emociona, só choca. O que salva a história é mesmo a direção e a montagem, que tornam cada drama angustiante e tenso.

Ainda merecem destaque as atrizes Adriana Barraza e Rinko Kikuchi, ambas indicadas ao Oscar como coadjuvante. Elas roubam a cena e são as verdadeiras protagonistas da história como a babá mexicana Amélia e a japonesa problemática Chieko. As estrelas Brad Pitt, Cate Blanchett e Gael Garcia Bernal aparecem em participações importantes, mas bem menores.

Eleito o melhor filme de 2006 no globo de ouro deste ano e indicado a sete Oscars - é favorito na categoria filme e tem muitas chances em roteiro original - “Babel” é um excelente filme, mas não me convenceu e não tem a minha torcida. E olha que sou fã do Iñarritu – “21 gramas” é um dos meus filmes preferidos. Mas dessa vez, faltou aquela sensação melancólica característica do diretor mexicano. Por isso, sou mais o Scorcese e seu filmão “Os Infiltrados”.

Cuidado! Se você ainda não viu o filme, este parágrafo revela trechos da história

“Babel” está sendo vendido como um ensaio sobre a incapacidade de comunicação entre pessoas de diferentes países, uma metáfora da globalização. Mas é, na essência, um melodrama sobre o egoísmo do ser humano e sua própria inconsequência. O personagem de Brad Pitt só pensa em salvar a mulher – e não está nem aí para a babá mexicana que não poderá ir ao casamento do filho. A babá também não está nem aí para os filhos dos patrões, e não pensa que levá-los para além da fronteira pode trazer problemas. A estudante japonesa só pensa que a polícia está atrás de seu pai por causa da morte de sua mãe – isso sem falar na obsessão que ela tem para resolver suas questões sexuais. Partindo dessa idéia, aí sim, o filme reflete bem o seu título. É a própria Torre de Babel moderna.

P.S.: Fabinho e Marcos, obrigada pelo convite!


Janaina Pereira

Comentários
Mas nem em sonho eu escreveria tão bem sobre qualquer filme quanto você, musa!

Você é, de longe, a melhor redatora do mundo - seja prá escrever sobre o que for..!!


Beijooooo e obrigado EU pelo carinho de sempre.
 
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