<$BlogRSDUrl$>

terça-feira, fevereiro 23, 2016

Sobre Fernandas


Cresci em uma família machista. De homens e mulheres machistas por todos os lados. Vi meu primo ser pai aos 15 anos e todo mundo achar normal; mas a minha prima, irmã dele, quando engravidou aos 17, foi um escândalo. Eu fui a única pessoa da família que a defendeu. Meu primo teve outros três filhos com três mulheres diferentes. Minha prima permanece casada até hoje com o pai de seu primeiro filho - ela teve outro depois.

Convivi com o machismo desde que nasci. Minha mãe desejava um filho homem porque 'mulher sofre demais'. Ouvi mil vezes que 'todo homem traí', que mulher deve aceitar a traição, e por ai vai. Não sei dizer de onde tirei forças para ser diferente desse mundo em que fui criada.

Sempre fui boa aluna na escola. Se um menino batia em mim, apanhava de volta. Uma vez, aos seis anos de idade, desci o braço no garoto que me chamou de mentirosa. Meu apelido era Mônica (sim, a do Maurício de Souza). Curiosamente, em um família machista eu ouvia do meu pai (um machista de carteirinha) que eu devia trabalhar e não pensar em casamento, porque marido não era emprego. Ele falava isso quando eu tinha apenas dez anos. Nunca entendi como ele, que era tão machista com a minha mãe, tinha um pensamento diferente com a sua única filha.

Meu pai morreu quando eu tinha 14 anos. Não sei se ele aprovaria a mulher que me tornei. Forte demais, independente demais, daquelas que os homens adoram detestar. Rejeitei por anos o rótulo de feminista, porque para mim o feminismo é visto como algo ruim - parece que são um bando de mulheres que odeiam os homens. E não é nada disso. Hoje penso que sim, eu sou feminista. Mas, acima de tudo, sou contra o machismo.

Detesto essa coisa de sair na rua e ouvir gracinhas. De um cara que mal me conhece segurar no meu braço. De ler bobagens de um fulano que mal me viu na vida. Ai vem a Fernanda Torres, uma mulher pública e que deveria pensar duas vezes antes de escrever bobagem. O que ela diz? "A vitimização do discurso feminista me irrita mais do que o machismo. Fora as questões práticas e sociais, muitas vezes, a dependência, a aceitação e a sujeição da mulher partem dela mesma. Reclamar do homem é inútil. Só a mulher tem o poder de se livrar das próprias amarras, para se tornar mais mulher do que jamais pensou ser.
Um homem fêmea."
Eu não quero ser um homem fêmea. E eu tenho que reclamar dos homens sim porque eles estão no comando. São eles que espancam as mulheres. Que assediam no emprego, na família, no ônibus, no metrô, na rua. São eles que ganham mais do que as 'fêmeas'. E são mulheres como a Fernanda que fazem outras mulheres serem diminuídas diariamente.
Existem muitas Fernandas por aí. Na minha família tem várias. E, ainda bem, por algum motivo que eu nem sei direito qual foi, eu não sou como elas. Quero sim um salário igual ao do jornalista que faz a mesma matéria que eu. Quero sim sair na rua sem ter medo de ser atacada/agredida. Quero sim usar decote sem ser julgada. Falar o que penso sem ser condenada. Sou mulher, muito mulher. Tive que ser - e ainda tenho - macho muitas vezes para impor respeito. Mas não gosto disso. Só que jamais vou abaixar minha cabeça para um homem ou uma mulher que me trate de forma desrespeitosa.
É inacreditável que em pleno século 21 a gente ainda veja esse tipo de coisa. Eu abomino o machismo, mas abomino ainda mais mulher machista. Sem mais.


This page is powered by Blogger. Isn't yours?